segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Na sola dos “cinco solas”




Confesso que os “defensores da fé” me cansam.

Cansam porque não produzem nada a não ser a crítica de quem pensa diferente. E para julgarem quem pensa diferente, tendo “base histórica” e “bíblica”, muitos deles utilizam-se dos cinco solas, que nada mais são do que afirmações, em latim, sobre aspectos que “delineariam” a confissão de fé cristã nos tempos “reformados” (o excesso de aspas é inevitável).

O interessante é que até os cinco solas são frutos de interpretação (como toda leitura da Bíblia o é) e de um tempo, de uma era. Torná-los imutáveis e monointerpretativos seria uma afronta ao próprio espírito da Reforma que dizem acolher. E quando se tornam engessados, viram arma nas mãos de seus utilizadores e, claro, a favor da “defesa da fé”.

Ok! Mas… que fé?

Aliás, que Cristo? Que Graça? Que Escrituras? Que Glória de Deus?

Não adianta você me tirar da cartola os cinco solas… primeiro tem que me dizer do que você está falando. Pode ser que usemos a mesma frase (em latim) para dizermos coisas totalmente diferentes, entendeu?

Vamos aos exemplos:

Quando eu digo SOLA FIDE (somente a fé), falo da experiência com o sagrado, com o intangível, o numinoso, o transcendente. E essa experiência não é privilégio só dos que têm a Bíblia como “regra de fé e prática”. A fé não tem copyright. Não é propriedade exclusiva de um grupo, muito menos de um livro. Fé é algo tão pessoal e místico que não me cabe duvidar da experiência do outro. Pode ser que ele, o outro, esteja experimentando uma face de Deus que eu ainda desconheço, por isso,este outro merece, no mínimo, o meu respeito.

Quando um “defensor da fé” diz SOLA FIDE, em primeiro lugar ele está falando do seu objeto de defesa. Fé deixa de ser a experiência para ser um objeto de defesa. E se for tido como experiência TEM QUE ser a MESMA experiência dele, se não, não é “verdadeira”. A experiência que é diferente da dele é um inimigo a ser combatido! Para isso envidará esforços, elegerá hereges, acenderá fogueiras. O importante é “batalhar pela fé uma vez entregue aos santos”. Fé, neste caso, é motivo de luta, de guerra, de defesa!



Quando eu digo SOLO CHRISTUS (Somente Cristo), estou falando de uma pessoa. O Deus encarnado, a Palavra feita gente, Emanuel, aquele que traduz em si o amor de Deus pela humanidade, tornando-se humano. De tão humano, divino! É amor tomando forma, cheiro, toque, voz… e, seguindo o seu exemplo, tornamo-nos melhores seres humanos. Quando digo o SOLO CHRISTUS me vem à mente que toda salvação passa por ele, o segundo Adão, e que se o primeiro Adão torna o pecado “universal”, o segundo Adão torna a salvação “universal”, sem mérito ou demérito de quem quer que seja. Se diferente disso, o “erro” do primeiro Adão seria mais forte e mais poderoso do que o “acerto” do segundo Adão. Por que a tal “solidariedade da raça” só vale para o pecado e não para a salvação?

Porém, quando um “defensor da fé” diz SOLO CHRISTUS, ele está dizendo que só a salvação na confissão de fé dele sobre o Cristo. Que só a salvação no NOME de “Jesus”. E quem não confessar esse NOME, por mais que nunca tenha ouvido falar dele, ou por mais que já viva na prática os seus ensinamentos, é um coitado, réu do inferno eterno. Talvez um predestinado mesmo à perdição, obra do grande amor de Deus, que cria uns eleitos para a salvação e outros para torrarem eternamente numa grande fogueira que Ele mesmo criou para lançar aqueles que Ele mesmo determinou que não creriam nEle. Quanto amor! Até porque o CHRISTUS só derramou seu sangue por esses “preferidinhos”, infelizmente deixando de fora todos os outros, tão amados de Deus quanto os eleitos, mas, por sua infinita soberania e poder, incapazes de chegarem à salvação.

Quando eu digo SOLA GRATIA (Somente a Graça), estou falando de graça mesmo, sem divisão, sem preferências. Falo de algo tão louco e absurdo que faltam-me palavras para descrever sua “ação”. A graça é injusta ao salvar gente “do bem” e gente “do mal”, gente “certinha” e gente “torta”, porque é graça, e porque graça atinge gente, seja a “gente” que for. E sua abrangência é ilimitada. Não há confissão de fé capaz de detê-la! Não há conceito que possa diminuir seus efeitos e seus desmandos. Sim, a graça é um desmando de Deus! Subverte toda a lógica e toda a noção que temos de “justiça”. É manifestação de Deus para todos, indistintamente. Creio numa graça que abraça prostitutas, gays, políticos, e até mesmo… religiosos.

Mas, quando um “defensor da fé” diz SOLA GRATIA, em primeiro lugar ele precisa distinguir a graça da graça. Como assim? É óbvio! Existe uma graça “comum” e uma outra, “especial”. Sim, é isso mesmo! Existe uma graça de segunda categoria, tipo aqueles cartões de natal que mandamos pra quem nem conhecemos, desejando simplesmente “boas festas”, e há uma graça caprichada, de primeira, como cartões escritos à mão, cheios de amor, com o cheiro da pessoa amada. A graça “comum” está aí para todos, “quem quiser pode chegar”. Já a graça “especial”, infelizmente (ou felizmente – para eles) não pode atingir a todos, é privilégio dos eleitos, estes sim, podem desfrutar de toda a graça que Deus tem pra dar, mas só pra eles. E graça aqui, deve ser entendida como favor imerecido também, é claro, mas… ai daquele que não observar os mandamentos!

Quando eu digo SOLA SCRIPTURA (Somente a Escritura), estou falando de uma carta de amor, inspirada por Deus, mas escrita por homens, contando histórias de seu povo, conforme seu entendimento temporal das realidades ao seu redor. Nesta carta, que fala muito mais da percepção que os homens, em seu tempo, tinham de Deus, percebo um Ser divino em todo tempo buscando relação com toda a humanidade. Um Deus que tem prazer no diálogo, na amizade, e que como prova maior dessa busca, se diminui, se enfraquece, e se faz homem, não porque “não tinha outra opção”, mas porque tanto amor tinha que ser demonstrado e vivido na sua completude, no ser igual ao ser amado. SOLA SCRIPTURA se manifesta quando percebo a carta de amor em toda sua amplitude e carinho, culminando na Palavra encarnada, o CHRISTUS. Por isso, qualquer interpretação que fuja do CHRISTUS e do amor encarnado nEle, causa-me estranheza. Aliás, o SOLA SCRIPTURA deve sempre levar em conta que QUALQUER leitura já é, em si, uma interpretação, logo, uma aposta e, se tanto, passível de erro.

Porém, quando um “defensor da fé” fala SOLA SCRIPTURA, ele está falando de um MANUAL. E, se é um manual, tudo está ali, resolvidinho, respondido, com a seção de “perguntas e respostas” completa, sem variações. Pecou? O manual traz o castigo, a forma de reprimenda, e o modelo de re-aceitação. Com o manual, é fácil saber quem é o certo e quem é o errado, afinal a equação é simples: faz tudo o que o manual diz: é bom! Vacila em artigos do manual: é mau! E tudo está lá, detalhadamente. Pastores são ungidos do Senhor, logo não devem ser questionados. Gays queimarão no fogo eterno. Mentirosos, orgulhosos, avarentos, ops… pulemos essa parte (aqui o manual deve ter cometido algum equívoco).

Finalmente quando eu digo SOLI DEO GLORIA (Glória somente a Deus),  penso num Deus que é glorificado em todo o mundo, por gente de todas as tribos, raças, línguas e nações que, mesmo não falando “O NOME”, amam uns aos outros, praticam o bem, são capazes de dividir, de compartilhar. Vejo Deus glorificado nas ações de uma Madre Teresa de Calcutá, repartindo sua vida entre os leprosos de uma índia fragmentada pelas castas, da mesma forma que vejo a glória de Deus num homem como Ghandhi, capaz de liderar uma revolução não armada e que influenciará um pastor negro nos Estados Unidos a fazer a mesma coisa. Vejo a glória de Deus quando milhares de pessoas, de todos os credos, gêneros e cores se unem numa corrente de solidariedade, como vi de perto em minha cidade, Teresópolis, atingida por uma tragédia sem precedentes em janeiro de 2011.

Entretanto, quando um “defensor da fé” diz SOLI DEO GLORIA, ele é capaz de ver a glória de Deus não nas pessoas que se solidarizam, mas na própria tragédia em si. Um Deus que mostra a sua glória através da sua ira! Um Deus que é glorificado mesmo numa atitude insana como a de um louco que invade uma escola e atira em crianças indefesas, matando vidas e sonhos. Um “defensor da fé” dá glórias a Deus por isso, e exalta a Sua soberania. A glória de Deus também é manifesta na destruição dos povos pagãos e finalmente, será exercida em toda a sua plenitude nos tempos finais, quando os eleitos herdarão os céus, e Deus, para a Sua própria glória, lançará os não-eleitos na churrasqueira da eternidade: o inferno!

E quem está certo? Não sei!

Só pretendo com este texto provocar a todos que se julgam donos da verdade. Pode ser uma pretensão descabida, mas tentem fazer esse exercício. Tentem imaginar que o “outro” pode ter razão. Assim como eu mesmo posso estar errado em muitas das minhas “visões”.

Estamos navegando naquilo que não é palpável, logo, tudo o que dissermos será fruto daquilo que somos, daquilo que pensamos, antes mesmo que o texto nos fale. E somos seres sujeitos À mudança, logo, não me cabe o julgamento de quem quer que seja. Que entendamos que, na sola dos “cinco solas”, muitas vezes colocamos nossas conveniências, aquilo que nos protege. Na sola (na base) dos nossos “cinco solas” na verdade estamos nós mesmos, com nossas esquisitices e doenças, logo, nossas interpretações falam muito mais de nós que dos reformadores.

E ainda mais, aos “reformados” cabe uma responsabilidade maior de não estacionarem em Genebra, ou em Wittemberg, ou seja lá onde for… a verdade, se é que concordamos que se manifesta em uma PESSOA, é dinâmica, tenta ouvir o seu tempo, tem o seu linguajar, tenta responder às suas próprias perguntas e não as do passado. Igreja reformada, sim, mas não engessada. Sempre se reformando!

Como disse, pode ser que eu esteja errado, e, se for um dos eleitos, riremos de tudo isso na “eternidade”. E se eu não for, sem problemas, vocês estarão ocupados demais e nem se lembrarão das pobres almas no inferno eterno.

Que Deus nos ajude!



José Barbosa Junior
Crer e Pensar

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Deus está morto! (uma morte lenta, cruel e dolorosa)




Deus está morto! (uma morte lenta, cruel e dolorosa)

Não se surpreendam com minha afirmação.  Nietzsche disse isto com muita sabedoria, e foi duramente criticado e muito mal interpretado. Antes de expor o porque de ter eu feito tal constatação e afirmação vamos tentar entender um pouco do que Nietzsche disse:
“Deus está morto! Deus permanece morto! E quem o matou fomos nós!”

Entendê-la literalmente, como se Deus pudesse estar fisicamente morto, ou como se fosse uma referência à morte de Jesus Cristo na cruz, ou ainda como uma simples declaração de ateísmo são ideias oriundas de uma análise descontextualizada da frase, que se acha profundamente enraizada na obra de Nietzsche. 
A frase não é nem uma exaltação nem uma lamentação, mas uma constatação a partir da qual Nietzsche traçará o seu projeto filosófico de superar Deus e as dicotomias assentes em preconceitos metafísicos que julgam o nosso mundo — na opinião do filósofo, o único existente — a partir de um outro mundo superior e além deste. A morte de Deus metaforiza o fato de os homens não mais serem capazes de crer numa ordenação cósmica transcendente, o que os levaria a uma rejeição dos valores absolutos e, por fim, à descrença em quaisquer valores. Isso conduziria ao niilismo, que Nietzsche considerava um sintoma de decadência associada ao fato de ainda mantermos uma "sombra", um trono vazio, um lugar reservado ao princípio transcendente agora destruído, que não podemos voltar a ocupar. Para isso ele procurou, com o seu projecto da "transmutação dos valores", reformular os fundamentos dos valores humanos em bases, segundo ele, mais profundas do que as crenças do cristianismo.

Segundo ele, quando o cheiro do cadáver se tornasse inegável, o relativismo, a negação de qualquer valoração, tomaria conta da cultura. Seria tarefa dos verdadeiros filósofos estabelecer novos valores em bases naturais e iminentes, evitando que isso aconteça. Assim, a morte de Deus abriria caminho para novas possibilidades humanas. Os homens, não mais procurando vislumbrar uma realidade sobrenatural, poderiam começar a reconhecer o valor deste mundo. Assumir a morte de Deus seria livrar-se dos pesados ídolos do passado e assumir sua liberdade, tornando-nos eles mesmos deuses. Esse mar aberto de possibilidades seria uma tal responsabilidade que, acreditava Nietzsche, muitos não estariam dispostos a enfrentá-lo. A maioria continuaria a necessitar de regras e de autoridades dizendo o que fazer, como julgar e como ler-o-mundo. (Ref. P. Rocha)


Agora vou tentar explicar meu ponto de vista; minha constatação.

Deus está morto! Pois a igreja (com toda sua pluralidade de denominações) e a religião que, como seus dogmas, o prenderam dentro das páginas de um livro, fazendo-o adoecer.

Deus está morto! Desde a tão louvada e aclamada reforma protestante (que nada reformou), a tinta e o papel lhe causaram uma intoxicação alérgica e como estava preso há alguns séculos, sua saúde debilitada quase não suportou passar pela reforma protestante.

Deus está morto! Pois não suportou a “força” das orações dos poderosos e poderosas senhores e senhoras da fé, pastores, bispos e os temíveis (até por Ele) apóstolos, que com suas orações e suplicas e determinações, torciam o já debilitado braço do ex-todo poderoso. Lesões e fraturas tornaram-se comuns, e como tinha que curar, e passar nos mais diversos concursos públicos, vestibulares, presentear com bens matérias a seus filhos, fieis dizimistas, não tinha sequer tempo de se auto curar.

Deus está morto! Pois todos conclamam para si o direito de posse sobre o “deus” verdadeiro, mas sequer sabem de fato ouvir sua frágil e debilitada voz que diz: liberte-me filho, das páginas deste livro, pois minha palavra é viva e vocês estão matando-me e de fato não me conhecem e não conhecem minha Palavra.

Deus está morto! Pela hermenêutica falha e exegese torta, oriundas das mais diversas escolas de teologias[sic] em que não há lugar para a razão e ciência, antes, prevalece-se a cegueira da fé e as interpretações hora preconceituosas, hora cheias de ódio e rancor. Sequer levam em conta que, toda ideia de uma hermenêutica certa é falha porque despreza a subjetividade de quem interpreta.

Deus está morto! E permanecerá morto, pois enquanto não pararmos de ouvir nosso próprio ego, abrirmos mão de nossos preconceitos e até conceitos, não conseguiremos jamais ouvir sua voz. Não conseguiremos jamais interpretar sua palavra, que é viva e eficaz.  

Procure ver Deus além das paginas dos livros de teologia, fora dos templos e fora da religião, tente encontrar a Deus fora das páginas de sua bíblia. Procure Deus fora da caixa, pois só assim encontrarás o Deus vivo! Ouse…

Pense nisto…

Anderson e Anja_Arcanja
Sola gratia

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Satã Roga Pelos Homens (By Brabo)




Entregue a Paulo Brabo e, gentilmente compartilhado,


Depois de tentar Jesus de todas as formas que conhecia, Satã deu-lhe as costas e começou a se afastar, considerando que valia à pena deixá-lo sozinho no deserto ponderando tudo de que havia aberto mão.
A poucos passos de distância ele parou de repente, como se uma absurda noção lhe houvesse ocorrido. Ainda de costas, o tentador virou apenas o rosto, para que Jesus pudesse ouvi-lo.

– Só mais uma coisa – ele disse. – Um conselho de amigo.

Jesus não respondeu. Sem se deixar abater, o tentador virou inteiramente o corpo, olhando Jesus de frente.

– Quero lhe recomendar uma coisa. Encare como tentação, se quiser, mas dentre todas essa deveria lhe 
interessar. Minha recomendação… Não: meu pedido é – e ele falava com simpatia sincera – não destrua a religião dessa gente.

Jesus ergueu para o outro dois olhos furiosos, mas permaneceu imóvel e em silêncio.

– Sei que já fiz muita coisa errada – o tentador deu de ombros, como que se confessando – mas convenhamos, hoje em dia a maldade anda no piloto automático: quase nunca preciso intervir diretamente. E, para falar a verdade, acabei me afeiçoando a essa gente. Caramba, eles são um bando de perdidos. Não há como não ter pena deles.

Satã olhou para conferir a reação de Jesus. Nenhuma.

– O que estou querendo dizer é o seguinte – ele levou a mão ao queixo e olhou para baixo, como se quisesse escolher bem as palavras.

Ele ergueu finalmente o rosto. Era um rosto bonito.

– Quero que essa seja uma briga justa, pra mim, pra você e até pra eles – ele fez um gesto vago indicando o resto do mundo. – E se você destruir a religião desse povo isso vai me dar uma vantagem que não quero de jeito nenhum.

Ele deu um passo na direção de Jesus.

– Então, se é isso que você tem em mente, peço que pense duas vezes. Esse é um povo sofrido, meu querido. Essa gente não tem nada. A religião é a última coisa, a única coisa a que essa gente pode de fato se apegar. Todo o resto eu tiro deles ou eles tiram uns dos outros. Eles se vendem, se compram, se destróem, mas a religião fica. Dá ordem à vida deles. Rédeas. E não se iluda – o Diabo ergueu um dedo enfático. – Não pense que eles vão se lembrar de Deus se você abolir a religião deles. Nenhuma chance. Eu minto muito bem mas não estou mentindo agora.

Ele deu mais um passo adiante, mais confiante agora.

– Eu sei como você é. Deve estar se preparando agora mesmo para sair denunciando as barbaridades dos que falam em nome Dele. Está certo, eu e você sabemos que não são poucas. Você deve estar sonhando que vai libertar os cativos, que vai dar genuíno cumprimento completo à Lei. Mas se é esse o seu plano, saiba que é o contrário é que vai acontecer. Nada escraviza mais do que a liberdade. Nada é mais incerto, e as pessoas precisam de segurança, a segurança que só a religião, especialmente a sua, pode dar. O mundo vai cair em confusão se você tirar o chão de debaixo deles. Não confunda essa gente. Faça essa cortesia: não por mim, mas por eles. Faça o que quiser, mas não tire a religião dos homens.

Satã deu um longo suspiro antes de concluir, com a seriedade da absoluta convicção:

– Ninguém quer a liberdade que você quer dar. Isso ninguém pode mudar. Nem você.

Jesus, que havia dispensado as tentações anteriores com um único verso da Escritura, sabia que esta exigiria muito mais. O pacote completo.

– No princípio… – ele começou.

E o Diabo o deixou, porque não era mais necessário.
 

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

O Poder do Sangue (deus ou deusa?)




Em antigas civilizações, o sangue menstrual era considerado sagrado, sinal de doação da vida. Acreditava-se que, ao cair o sangue juntamente com o endométrio desprendido do útero, a terra ficava adubada, propícia para a plantação, sendo uma promessa de colheita abundante. Mitos agrários, relacionados à morte e regeneração, foram desenvolvidos e usados como uma alegoria do ser humano. E o centro de tais cultos era a mulher, vista como a portadora e doadora da vida.

Nessa cultura voltada ao feminino, o período da menstruação era considerado um tempo especial e sagrado. E não tardou que percebessem que o ciclo menstrual coincidia com o ciclo lunar. Criou-se a partir daí uma ideia mística em relação ao poder da Lua, tida como a representação da Deusa. O sangue então era a manifestação da divindade, a "força de vida" ou o "espírito fluído". Conta-se que o sangue menstrual era celebrado e sorvido. E quem dele tomava, acreditava-se, ganhava poder, força e vigor.

Quando ouvi isso pela primeira vez, fiquei deveras curioso, pois senti que aí estava a chave para algumas das perguntas que eu fazia enquanto cristão. Por exemplo, por que tanto no terceiro céu quanto nos quintos dos infernos só tem macho? É Deus Pai, é o Filho, é o Espírito Santo, é o Anjo Gabriel, é o Belzebu... Tudo macho! Os pronomes e nomes são todos masculinos numa cosmovisão inteiramente  machista e patriarcalista. E o mais curioso é que eles não tem sexo! Se o Criador não tem sexo, então eu posso chamar ele tanto de Deus quanto de Deusa, certo? Se ele não tem genitália, então eu posso chamá-lo de Mãe ao  invés de Pai! Me disseram que não, que esse negócio de Deusa não é bíblico, e que chamar Deus de Mãe fica muito esquisito. Não me convenci.

Foi lendo sobre as antigas tradições que deparei-me com a história dos rituais de menstruação e que as mulheres eram vistas como representantes do divino. Uma ligação que não tem segredo. Pois, é a mulher que gera, que faz crescer dentro se si e quem traz ao mundo uma nova vida. A porta da vida é a mulher. E após a criança nascer, a mulher, agora na qualidade de mãe, é quem cuida e continua nutrindo. Esse fato maravilhoso de gerar e cuidar de uma vida fez nascer a crença na Grande Deusa Mãe, venerada por todos os povos em todos os tempos.

"Mãe: a palavra mais bela pronunciada pelo ser humano", escreveu o poeta Kahil Gibran. É lugar comum ouvir que nada se compara ao amor de mãe. E isso não é de agora. Platão lamentava a perda de sua mãe com essas palavras: "Tenho irmãos, pai, mas não tenho mãe. Quem não tem mãe, não tem família." Se a figura feminina é o grande símbolo de amor e ternura, como então é que foi estabelecido o culto ao deus pai?

A figura masculina advém das culturas de guerra. Em tais culturas, o amor e a ternura não eram os mais importantes. Fazia-se necessário cultivar o orgulho, a bravura e o ódio. A figura que cuida e que nutre não convinha ao ideal da guerra. Para incitar o desejo de conquista, um deus macho foi criado e a ele deram vários nomes-títulos bem apropriados: Skanda (deus hindu, "Senhor da Guerra"), El (deus cananeu, "Soberano"), Baal (deus cananeu, "Senhor da Guerra"), Elohim Tzevaot (deus hebreu, "Senhor dos Exércitos"), Ares (deus grego, "Senhor da Guerra")... Todos esses deuses personificavam o desejo por poder e sede de conquista. E, embora muitas nações cultuavam tanto a Deusa quanto o Deus, teve casos em que os líderes se esforçaram ao máximo para banir quaisquer resquício do culto à Deusa. Notavelmente, os sacerdotes do Judaísmo muito se esforçaram para que Astarote – um dos nomes da Deusa Mãe –, fosse banida, afim de que o culto fosse prestado unicamente ao Elohim Tzevaot (Juízes 2:13; 1 Samuel 31:10; 1 Reis 11:5). De fato, todo o esforço era para que a nação fosse construída sob o ideal da guerra – Deuteronômio 20:20; 21:10.

Quero abrir aqui um parêntese de suma importância. O leitor atento que conferiu em sua Bíblia as passagens referidas acima, pôde ver que Salomão tornou-se um adorador da Deusa Mãe. O interessante é que o reinado de Salomão foram dias de paz. Não havia guerra. Então que sentido havia em adorar Elohim Tzevaot? Nenhum. Embora o escriba jeovista tenha escrito, e isso bem posteriormente, que "as mulheres corromperam o coração de Salomão" (1 Reis 11:2 a 4 - note bem em quem o escriba machista colocou a culpa), o homem dito "o mais sábio da Terra" viu que havia mais favor em adorar a Deusa Mãe, que representava a paz e a celebração da vida, do que em adorar ao ranzinza deus Jeová, "o Senhor dos Exércitos". Fecha parêntese.

Se na cultura matriarcal, o rito estava vinculado ao sangue da menstruação (que significa mês da lua), como se daria a transposição para a cultura patriarcal? A única alternativa seria o sangue derramado através da imolação: o holocausto de primogênitos e, posteriormente, o sacrifício de ovelhas e bois. Se antes era o sangue menstrual, a prova concreta da dança da vida, agora o sangue derramado de bois e ovelhas seria representativo no caráter de substituição: o derramamento de sangue inocente para satisfazer as exigências de um deus de mandamentos e de culpa – Levítico 4:20.

Do sangue da menstruação ao sangue do sacrifício. A sublevação patriarcal! E nessa passagem um duro golpe foi desferido no sagrado feminino:

- Mas a mulher, quando tiver fluxo, e o seu fluxo de sangue estiver na sua carne, estará sete dias na sua separação, e qualquer que a tocar, será abominável até à tarde. (Levítico 15:19)

Estratégia política perfeita. Se antes a menstruação era exaltada como símbolo da vida, agora, segundo a tradição patriarcal, o sangue menstrual passa a ser chamado de "o fluxo imundo", numa estratégia clara de poder de controle dos corpos. Com a menstruação sendo proscrita, a Deusa passou a ser considerada a "Grande Abominação".

Mas o que seria oferecido em troca do sangue da menstruação? A única possibilidade de troca seria por meio do sacrifício, o sangue vertido através de um holocausto expiatório. E o ápice dessa transmutação foi o que veio a ser conhecido como "o sacrifício do filho de Deus", este tido nas escrituras pagãs, e, posteriormente, no pensamento judaico-cristão, como o "Sol da justiça" – Malaquias 4:2.

O Sol, símbolo da divindade masculina, foi posto em oposição à Lua, símbolo da divindade feminina. Do sangue da mulher ao sangue de um homem morto numa cruz. E nesse processo, coube à mulher o estigma da virgindade e a obrigação da obediência e do silêncio, agora representada pela figura da Virgem Maria que, significativamente, era desenhada pelos primeiros cristãos como "uma mulher vestida do Sol e tendo a Lua debaixo de seus pés"! – Apocalipse 12:1.

Hoje os cristãos celebram a morte de Jesus, tido como o sacrifício definitivo por toda a humanidade. E o sangue derramado na cruz é visto como a fonte de perdão e salvação (Mateus 26:28). Apresentado:

- Este cálice é o novo testamento no meu sangue, que é derramado por vós. (Lucas 22:20)

Se você perguntar para um padre ou para um líder protestante sobre a importância do sangue de Jesus, ambos lhe dirão que se trata de um "sacramento". Palavrinha esquisita, não? Então você ouvirá a explicação de que sacramento significa "um sinal da presença de Deus em nossas vidas". Aí estará tudo explicado e bonitinho, exceto pelo detalhe de que a palavra sacramento se origina provavelmente de sacer mens, literalmente, "menstruação sagrada".


Paz das origens


Netanias Alves

domingo, 15 de janeiro de 2012

Será que resta algo, que ainda seja de bom proveito? (teria eu me tornado ateu?)



Faz muito tempo que vivo mergulhado na imensa e imunda hipocrisia humana, ah, como eu gosto dessa nojeira toda!
Como aprecio toda essa porcaria, que envolve os interesses mais mesquinhos; a falsidade; a mentira.

Já faz algum tempo que deixei de lado o sentimentalismo chorão; perdei a aquela doce ilusão de que o amor, sincero e puro, existe, afinal, não é isso que move a sociedade.

Como que se algum dia acreditei, deixei todas as crenças de lado, afinal, sou eu o próprio deus em essência, então, para que cultuar terceiros?  (será?)

Debochadamente, ouço aquelas frases montadas que, nem a interpretação o interlocutor sabe direito; vejo com ceticismo toda a falácia de bondade e misericórdia, já que a inveja sempre é a que prevalece.

O sinismo é a residência fixa de muitos, cujo endereço está no coração descompassado, famigerado e sanguinolento.

Pactos são desfeitos; laços esquecidos e, a vaidade toma forma descomunal, para quê?

A imbelicidade, quem sabe seja a nossa forma natural e, o destempero com o trato; a falta de respeito, travestida de amor sincero e verdadeiro, além da famosa, porém, nem tão sincera amizade, cultuada nos mais diversos sanctus sanctorum.

Bestifico-me entre as bestas, torno-me mais um podre na podridão, mas, sem perder a pose; sem deixar escapar das minhas lentes visuais a tola infantilidade do ser, que tem no seu propósito a missão de enganar e iludir, principalmente, a si próprio e, no final, pergunto-me curioso: Será que resta algo, que ainda seja de bom proveito?

Gê Vorib

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Diante da Graça Ficamos Todos Nus




Já disse o Ariovaldo Ramos que a Graça é uma disposição no coração de Deus em nosso favor; não é uma pessoa, não é um poder autônomo desvencilhado das outras características de Deus...

Já se imaginou nu diante de muitas pessoas? Consegue sentir a tamanha timidez e falta de segurança que isto poderia causar a qualquer pessoa de bom senso, a qualquer ser humano mediano? Bem, é mais ou menos isso que a Graça gera na gente quando passamos a compreendê-la um pouco melhor.

Não ter condição alguma de pagar o favor de Deus, não dispor de nenhuma artimanha nem ter carta alguma na manga a fim de poder tratar de igual pra igual, estar desprovido de qualquer corrimão quando da subida que conduz ao trono celeste, é assim que podemos nos sentir ao receber da Graça de Deus.

A nudez total revela nossa incapacidade de alcançar o dom eterno por conta própria. E por estarmos nus, não podemos nem blefar, não há aparências nem máscaras, não há onde esconder nossas mazelas, só há a nudez pessoal, impotente; e nos encontramos frágeis como bebês diante do poder de Deus.

Não há o que fazer, nosso poder de compra não tem valor algum diante do Eterno, e isso traz um tipo de insegurança maravilhosa; dá medo no início... a vontade de pagar pelas bênçãos é quase incontrolável, mas daqui a pouco passamos a entender que para adentrarmos no Reino necessitamos de abrir mão do “poder” de compra, inútil para este tipo de bem! No Reino só recebe quem pede, todo favor é inegociável!

Só pode desfrutar verdadeiramente da Graça quem já se desnudou de suas seguranças, só pode desfrutar verdadeiramente a Graça quem abandonou as velhas vestes do mérito pessoal e se apossou das vestes do amor. Somente quem já não necessita se defender, se justificar, pagar, comprar, barganhar...

Quer provar da Graça?... Então, o que está esperando? É só se desnudar!...

Via
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