ESTE TEXTO MERECE SER LIDO POR TODOS QUE SE DIZEM CRISTÃOS (CUIDADO, TEXTO FORTE COM PALAVRAS CHOCANTES, PORTANTO SE VOCE FOR HIPÓCRITA, NÃO LEIA!)
Cristianismo
Radical - Brava Gente Brasileira -
por Eliasaf de
Assis
Descobrindo entre os marginalizados e
miseráveis o que realmente significa seguir a Cristo
Nota da Redação: O artigo a seguir descreve
um trabalho singular desenvolvido numa região decadente do centro de São Paulo.
Há extensas citações do Pr. Paulo Cappelletti, presidente da missão. Suas
afirmações não representam necessariamente a opinião do Conselho Editorial da
revista Impacto e podem até chocar o leitor. Entretanto, consideramos que o
trabalho que faz e o preço que paga lhe dão pleno direito de ser ouvido, até
nas suas críticas à igreja como está hoje. Pedimos, tão-somente, que o leitor
pondere tudo com coração aberto e retenha o que o Espírito lhe vivificar. Seja
impactado!
Cruzando ruas famosas pelo comércio
especializado de produtos eletrônicos, nossa atenção era disputada por lojas
com CPU’s, cd-rom’s, instrumentos de som e garotos deitados na calçada fumando
cachimbos de crack. Prostitutas de várias idades faziam “ponto” em estreitas
portas de hotéis imundos, ladeados por lojas com cartazes de “impressoras laser
usadas em 3 vezes sem juros”.
Percorríamos o centro velho de São Paulo,
região conhecida como Crackolândia, dada a facilidade de se verificar o uso de
drogas a céu aberto. A visão de crianças entorpecidas é revoltantemente comum.
Tradicionalmente descrito como antro de vício, prostituição e crimes violentos,
o centro velho não muda a despeito dos planos municipais de revitalização. E
nos últimos anos, a decadência e ruína estão mais profundas.
A Missão CENA
Um grupo de jovens seminaristas me
acompanhava em uma visita à missão CENA (Comunidade Evangélica Nova Aurora).
Encontramo-la instalada em um prédio antigo que serviu a um histórico clube de
São Paulo. Uma grande fila de moradores de rua aguardava o início da
distribuição de refeições. Ao passar por eles, fomos envolvidos por uma
atmosfera de odores, cuja emanação ia do cheiro fétido de corpos sem banho ao
agradável aroma da comida. A equipe, formada por gente de todo lado
(recuperados, missionários brasileiros, suecos, ingleses, americanos...),
estava a todo vapor: panelas chiavam na cozinha, esfregões e rodos limpavam o
chão, organizadores ordenavam a espera pela refeição e as filas de banho. Na
hora das refeições, os moradores de rua passam primeiramente pelos banheiros,
estrategicamente posicionados. Banho primeiro, refeição depois. Nem todos
gostam.
Assim que chegamos, nos deram serviço. O
pessoal foi se envolvendo em algum afazer. Podado de dons que parecessem úteis,
como eu ajudaria? Ocasionalmente utilizava um rodo (o maior que já vi!) para
puxar a água do chão. Então piorou: pediram que eu pregasse, uma mensagem
rápida de uns 5 minutos. Não me lembro do que falei, mas sim do esforço em
escolher palavras adequadas. Foi difícil! Sentados diante de mim, aguardando a
refeição, dezenas de moradores de rua oscilavam entre impaciência, torpor
alcoólico ou um inesperado interesse. Público heterogêneo: homens e mulheres
com históricos diversos: trabalhadores braçais que perderam o teto,
profissionais especializados que sofreram decepções amorosas, portadores de
doenças mentais e gente que nem se lembra mais como foi parar na rua.
Quando terminei, alguém sugeriu que me
sentasse com os mendigos e conversasse. Movi a cabeça procurando um
interlocutor. Um homem de idade indecifrável, estimo que de 30 a 50 anos,
chamou-me a atenção. Mesmo após o banho, sua pele estava encardida e manchada, e
o rosto grande e anguloso, emoldurado pelo cabelo desgrenhado, compunha uma
selvagem aparência; parecia uma espécie de viking moreno.
Não demorou e desenvolvemos uma animada
conversa. Ele explicou detalhadamente como conseguia CPF’s frios e outros
documentos, tarefa que fazia com regularidade, para si e para outros. Um dos
jovens que me acompanhava sentou-se conosco. Animado com o aumento da platéia,
o homem contou sua história mais impressionante: sofrera um atropelamento há
quase dez anos. Seus intestinos ficaram expostos enquanto sangrava sob as rodas
do carro. Socorrido, foi levado ao Hospital da Santa Casa, onde passou por uma
operação paliativa. Avesso ao ambiente hospitalar, fugiu antes da cirurgia
definitiva. Abriu então a camisa, soltou uma faixa que o envolvia na região do
abdômen e mostrou, a mim e a um assustado seminarista, como seu ânus estava
agora na barriga, ao lado do umbigo. Apesar desse susto, os sentidos de meu
coração foram adaptando-se, e pude perceber além da aparência: vi uma pessoa singular,
vivaz e inteligente, feita à imagem de Deus, ainda que coberta com a fuligem da
rua e tornada invisível pela indiferença da grande cidade.
Com as portas do carro travadas, vidros
fechados e ar-condicionado ligado, cruzamos com eles sem vê-los. Mas ali,
criadas à imagem de Deus e por ele amadas com obsessão, no espaço entre a pista
e a calçada, vivem, moram e morrem pessoas singulares. E a distância entre nós
não é medida em metros, mas em compaixão. Nossa compaixão as alcançará?
O Que Fazer?
A missão CENA tenta cobrir essa distância.
Seu presidente, Pr. Paulo Cappelletti, é avesso a qualquer culto de
personalidade. “Aqui não homenageamos ninguém. Na CENA há muito trabalho, não
personalidades em evidência”, diz. A seu pedido, devo chamá-lo como é conhecido
nas ruas: Macarrão.
Foi uma das melhores conversas que tive:
atendeu-me prontamente, embora tivesse um compromisso dali a pouco tempo.
“Vamos levar uma maca ginecológica para um prostíbulo. A ginecologista atende
aqui no clube. Mas é difícil as garotas virem, só aquelas com muito vínculo com
as missionárias. Fomos ao prostíbulo, conversamos com as meninas e sugerimos
levar a ginecologista com a maca para fazer um exame papanicolau. O mais
difícil foi explicar que o exame exige 72 horas sem ‘trabalhar’.”
Alto e grisalho, com voz forte e fala
jovial, Macarrão exprime-se com uma franqueza desconcertante. Quando discutimos
sobre o tempo que leva a recuperação de dependentes, ele responde: “Quanto a
converter, eu mesmo estou tentando... não podemos deixar de enfatizar o
processo de crescer em Cristo”. Ele apresenta casos em que o trabalho de
recuperação durou mais de 10 anos.
Macarrão mora com seus dois filhos e a
esposa Sílvia, que é assistente social, em uma casa família com mais 20
pessoas, todas elas tiradas das ruas. Tomei um café da manhã com eles, certa
vez, e os vi lidando com problemas bem familiares, como estímulo a leitura e
preparo para procurar emprego.
Agora ele está vestido com uma bermuda,
camiseta e havaianas, e parece-se muito com algum dos atendidos pela missão.
Sueli pergunta se ele vai se arrumar. “Vou a um prostíbulo”, responde
bem-humorado. “Quanto mais malvestido, melhor...”.
Macarrão é famoso por pregar uma vez nas
igrejas e não ser convidado de novo.
Na inauguração de um templo novo e luxuoso,
não resistiu e trombeteou lá do púlpito:
“Segundo a escatologia pré-tribulacionista,
este templo vai ficar pro diabo. Aqui deveria funcionar um albergue ou uma
creche. Já que fez, use! Em vez de templos de uso exclusivo de uma igreja,
deveríamos levantar prédios para uso comum dos cristãos, da sociedade e
comunidade adjacente. O templo é um instrumento, não deveria ser um monumento
erigido a nada. O movimento evangélico de hoje não se assemelha de jeito nenhum
ao movimento do século XVI. Além disso, historicamente a Reforma se adequou aos
ricos”.
Sem Máscaras
“A igreja perdeu o rumo. Ernst Kasemann, o
teólogo, dizia já em 1931 que não podemos comparar o cristianismo atual com o
Cristo Senhor. O que o cristianismo tem a ver com Cristo hoje? Kierkegaard
também disse que o mundo religioso cristão é parecido com uma festa de
máscaras”.
Kasemann e Kierkegaard? Uma citação
surpreendente feita por um pastor que empurra uma mesa ginecológica rua acima.
Profundidade intelectual, espiritualidade prática e uma atitude questionadora
são características de Macarrão.
O Movimento de Jesus: em direção aos pobres
“Parte da razão de as igrejas não se
interessarem pelo pobre é facilmente respondida: como vou pedir dízimo de um
sem-teto, que vive na rua? Nós é que temos que dar nosso dízimo pra ele! Madre
Tereza teria dito o seguinte: ‘Se houver pobre na lua, iremos até lá’. O
movimento de Jesus é um movimento em direção aos pobres. Que não são muito
diferentes de Jesus: ele não tinha onde morar ou o que comer. Se ele não era
pobre, o que era então? A frase em meu orkut e msn é ‘aquele que quer pregar o
evangelho aos pobres, tem que se fazer pobre como eles para que o reino de Deus
apareça’. Quem prega o evangelho tem que conferir ao pobre alguma dignidade,
uma possibilidade de vida nesta Terra, tornar sua vida melhor. Jesus deixou a
sua riqueza para que os pobres pudessem ser ricos. Ele perdeu sua vida para que
os pobres que morrem possam ter vida. A intenção do evangelho é esta: dar vida.
E essa vida acontece fora, no convívio e no caminhar. Ajudando alguém a
conseguir emprego, ‘batendo na porta’ das empresas junto com ele e mobilizando
pessoas a ajudar e repartir seu dinheiro com os pobres.
Há sentido em 2.500 pessoas estarem dentro
de um templo e ao final alguém dizer: ‘o culto foi maravilhoso!’? Maravilhoso
em quê? Onde Deus se manifestou? O rico ficou mais pobre? O pobre ficou mais
rico? Algum dos pobres da igreja teve ajuda para construir sua casa? Levantar a
mão, ir à igreja, sentar no banco e ouvir um sermão, cantar as mesmas músicas
todo domingo... Será que a vida cristã se resume a isso, uma espécie de
monastério dominical? Eu não consigo viver assim.”
A Conversão Deve Ser do Coração
“A maioria dos pastores não se importa com
aspectos essenciais do cristianismo, como moral ou mesmo perdão. Jesus disse em
Mateus que se você tem algum problema com alguém, primeiro pede perdão e depois
oferta. Minhas ofertas devem condizer com minha vida com Deus. Finanças não
deveriam falar tão alto. Mas ouvimos sermões em que gente berrando condena
pessoas que não dão o dízimo. Mesmo com tantas necessidades que experimentamos
na missão, ouso dizer que o problema da igreja não é dinheiro: é um problema
moral e, por que não dizer, de conversão.
“Não há uma conversão do coração, e sim uma
conversão psicológica. Só isso explica andar pelo centro velho de São Paulo e
não ter compaixão pelas pessoas caídas. Não dá pra viver um ‘evangelho’ que não
se compadece das pessoas. Como alguém convertido de verdade poderia ver alguém
passando fome e dizer: ‘eu vou orar por você...’. A julgar pelo que diz o
apóstolo João, o que devemos é agir!”
À nossa volta, o cenário é de decrepitude e
abandono, mas Macarrão fala com fé e entusiasmo sobre os planos da missão: uma
creche para filhos de prostitutas, um projeto filantrópico para construção de
casas populares...
Eu e minha turma rumamos pra casa. Vejo
toda aquela gente embarcando no metrô lotado, corpos coladinhos, cada um
vivendo um mundo tão distante um do outro! Eu não consigo imaginar Jesus
fazendo outra coisa que não fosse envolver-se com as pessoas, chorar por elas,
buscar os marginalizados. Todos que desejam ver Jesus caminhando em nossas
esquinas e cortiços, condomínios e avenidas, farão das palavras finais de
Macarrão uma oração:
“Não quero ser chamado de reformado nem de
evangélico. Eu quero ser conhecido como cristão, porque quero seguir a Cristo.
Quero ter ações na Terra que promovam a pessoa de Jesus.”
Obs. O Pr. Paulo Cappelletti está
atualmente abrindo um novo trabalho nos mesmos moldes em outro local da Grande
São Paulo.
CLIQUE NOS LINKS E ASSISTA AOS VÍDEOS MOSTRANDO O TRABALSO MARAVILHOSO QUE ESTE PASTOR FAZ
parte 1 http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=HryPbHx_9fk
parte 2 http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=vmz6qD8Umsk
parte 3 http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=59Iztqj4JfY
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Para maiores informações:
http://www.missaocena.com.br
Pr. Paulo Cappelletti |
3 comentários:
Belo exemplo de cristianismo... Já conhecia o trabalho do Macarrão... sempre oro por ele... e outros tantos que estão espalhados pelo mundo afora... toda Glória a Deus.
Precisamos voltar ao evangelho, metanóia e reforma já!
Isto é que é o cristianismo verdadeiro... o verdadeiro evangelho inclusivo...
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