Por Donizete
Essa breve reflexão, serve como um convite para melhor
entendermos o fenômeno e criar clareza sobre este tema tão polêmico, para
podermos nós mesmos superar certas dimensões fundamentalistas embutidas em
nossa cultura, quem sabe até em certos comportamentos pessoais.
Na verdade o termo fundamentalismo tornou-se a palavra de
acusação em voga. Entretanto fundamentalista é sempre o outro. Quando é
aplicado para nós mesmos, geralmente preferimos o emprego de outros termos.
Existem fundamentalismos em todas as áreas, ainda que em
muitas delas, preferem o uso do termo “radicalismo”. Ele está presente nas
religiões, na política, na economia, e, em tantas outras ideologias. Os
fundamentalismos estão aí com grande ferocidade, e representa um risco para a
pacífica convivência humana e para o futuro da humanidade.
O fundamentalismo cristão atual, que é o objeto de discussão
nesta postagem, tem sua origem no protestantismo norte americano do século XIX.
O termo foi cunhado em 1915, quando professores de teologia da universidade de
Princeton (numa contra ofensiva ao liberalismo teológico nascente) publicaram uma coleção de doze volumes com o
título: “fundamentalismo. Um testemunho da verdade”.
Neles propunham um cristianismo extremamente rigoroso,
ortodoxo, dogmático, como orientação contra a avalanche de modernização de que
era tomada a sociedade norte americana.
A tese dos fundamentalistas no âmbito religioso é afirmar
que a Bíblia constitui o fundamento básico da fé cristã e deve ser tomada ao pé
da letra. O fundamento de tudo para a fé protestante é a Bíblia. Cada palavra,
cada sílaba e cada vírgula, dizem os fundamentalistas, é inspirada por Deus.
Como Deus não pode errar, então tudo na Bíblia é verdadeiro e sem qualquer
erro. Como Deus é imutável, sua palavra e suas sentenças também o são. Valem
para sempre.
Em nome deste literalismo, os fiéis opunham-se às
interpretações da assim chamada teologia liberal. Esta usava os métodos
histórico-críticos e hermenêuticos para interpretar textos escritos há dois,
três mil anos.
Nos métodos supracitados, parte-se do princípio de que a
história e as palavras não ficaram congeladas no passado. Elas mudam de sentido
ou ganham novas ressonâncias com as mudanças dos contextos históricos. Por isso
precisam ser interpretadas para que seja resgatado o sentido original.
Este procedimento para os fundamentalistas é ofensivo a
Deus, obra de Satanás. A Bíblia, não precisa ser interpretada, ela á a Palavra
de Deus, e o Espírito Santo ilumina as pessoas para compreender os textos. Por
razões semelhantes se opõem aos avanços contemporâneos da história, das
ciências, da geografia e especialmente da biologia que possam questionar a
verdade bíblica.
Para o fundamentalista, a criação se realizou mesmo em sete
dias. O ser humano foi feito literalmente de barro. Eva é tirada da costela
física de Adão. O preceito “crescei e multiplicai-vos, enchei e subjugai a
terra, dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre tudo o que
vive e se move sobre a terra” deve ser tomado estritamente ao pé da letra,
pouco importando-se essa dominação venha por em risco a biosfera. Mais ainda:
só Jesus é o caminho, a verdade e a vida, o único e suficiente salvador. Fora
dele há somente perdição.
Em face dos demais caminhos, o fundamentalismo é
intolerante, na moral é especialmente inflexível, particularmente no que
concerne a sexualidade e a família. É contra os homossexuais, o movimento
feminista e os demais processos libertários em geral.
O fundamentalismo não é uma doutrina. Mas uma forma de
interpretar e viver a doutrina. É assumir a letra das doutrinas e normas sem
cuidar de seu espírito e de sua inserção no processo sempre variável da
história.
Fundamentalismo representa aquele que confere caráter
absoluto ao seu ponto de vista.
Imediatamente surge grave conseqüência: quem se sente
portador de uma verdade absoluta não pode tolerar outra verdade, e seu destino
é a intolerância. E a intolerância gera o desprezo do outro, e o desprezo, a
agressividade, e a agressividade, a guerra contra o erro a ser combatido e
exterminado. Irrompem conflitos religiosos com incontáveis vítimas.
Não há ninguém mais guerreiro do que a tradição dos filhos
de Abraão: judeus, cristãos e muçulmanos. Cada qual vive da convicção
tribalista de ser o povo escolhido e o portador exclusivo da revelação do Deus
único e verdadeiro.
Via Logos & Mythos
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