Por Altamirando Macedo
O grego Orígenes (182-254), escritor eclesiástico
e professor da Escola de Catequização em Alexandria, era o teólogo mais
eminente da antiguidade cristã e o primeiro defensor de uma pesquisa bíblica
crítica. Com sua formação platônica, Orígenes deu à “Escritura Sagrada”
interpretações alegóricas tornando-a acessível à mentalidade da época. O quinto
concílio condenou o dissidente e proclamou a sua exegese como desvio da
fé. “Aquilo que, doravante, deve ser aceito como a fé verdadeira, será
proclamado única e exclusivamente pela alta hierarquia eclesiástica, inspirada
pelo ES, a cujo cargo fica a convocar as pessoas devidamente inspiradas”.
Com esta deliberação conciliar, teve início a perseguição não somente aos
numerosos adeptos de Orígenes, mas a todas as pessoas de credos diversos.
A Bíblia não é a “palavra de Deus”. Os ensinamentos da
fé elaborados nos primeiros cinco concílios por toda uma legião de príncipes da
igreja, apesar do carisma dos conciliares, não foram inspirados pelo Espírito
Santo. Para o leigo crente e simples, isto constitui um choque muito forte por
se encontrar despreparado.
O que acontece com Jesus? Existiu? Deu seu sangue na cruz
por “nós, pecadores”? Teria pregado, ele próprio, o que relata o Novo
Testamento? E, se os textos supostamente divulgados por Jesus não foram de sua
autoria, de onde provêm as 1500 cópias dos textos primitivos? Um só personagem
dos muitos que sofreram a morte na cruz não pode sustentar e perpetuar tamanho
culto à pessoa.
Todavia basta, por exemplo, ler os comentários feitos pela junta de autores a
respeito de “Jesus, Filho do Homem”, de Rudolf Augstein, para nesta tentativa
de contestação, reconhecer a antiquíssima técnica que Joachim Kahl qualificou
de “encobrimento”.
Os teólogos cristãos constituem em pedra angular da religião
cristã, o dogma religioso, o dogma de Jesus e exigem validade inconteste deste
poder não comprovado. As centenas de milhares de pastores e padres de todas as
igrejas cristãs perderiam a si próprios e o seu cargo se não pudessem mais agir
em “nome de Jesus”. Honestamente e sem leviandade, deveriam dizer ao seu
dizimista, sentado ali na 13ª fileira de bancos da sua luxuosa nave central que
Jesus de Nazaré não é o “Filho Unigênito
de Deus” e jamais se proclamou como tal. A que título as igrejas cristãs
invocam um Jesus que não existe, ensinamentos que ele não deu, autoridade que
ele não outorgou e uma qualidade de filho que ele jamais reclamou?
“Pois não me foi dado crer simplesmente porque para tanto fui mandado”.
Ao longo de dois milênios, desde o nascimento, o cristão
carrega um fardo intolerável. Explica-se a ele que já nasceu manchado pelo
pecado original e, para livrar-se deste, precisa do “Salvador”. Aprendemos na
igreja que Deus é o começo e o fim de tudo, que é o alfa e o ômega, que Deus é
todo-poderoso, todo-bondoso, todo-justo, onisciente, sublime, eterno e
onipresente. Este é o conceito que aprendi sobre Deus. Mas Deus também é
infinito por ser eterno. Ele desconhece o hoje, o amanhã. O Deus eterno e
onipresente não precisa esperar pelos resultados de suas medidas já que os conhece de
antemão. Pois, pois...
Deus em sua infinita bondade brindou duas pequenas e
ingênuas criaturas humanas com a estada no paraíso, o lugar de alegria e
felicidade. Os eleitos foram denominados Adão e Eva que viveram dias
despreocupados, sem anseios nem saudades. Mas havia uma proibição feita por
Deus: Comer a fruta do conhecimento, aquela árvore era proscrita. É
estranho. Porque o Todo-poderoso deu proibição tão rigorosa? Teria Ele, tido
prazer com aquele jardim de infância? Poderia Deus participar do sentimento
humano? Deus queria dar o amor e desejava que os dois participassem do
seu reino. Segundo esta interpretação, Deus teria ansiado por companhia ou
amor. A meu ver estes sentimentos não condizem com Deus, que, em sua qualidade
de todo-poderoso se sente irrestritamente feliz. Afirmar que Deus queria tentar
Adão e Eva fazendo-os passar por uma prova seria uma visão mesquinha sobre
Deus? “Tentação e prova” seria jogar com cartas marcadas. Uma trapaça? Já que,
de antemão, Deus, “onisciente” conheceria o resultado desta tentação e prova.
Não vale dizer que Adão e Eva estavam perfeitamente à vontade para comer
ou não da árvore do conhecimento, pois, também a este respeito, Deus teria sido
informado de antemão. De qualquer modo vamos levar a ideia até o fim.
Suponhamos que eles não tivessem mordido a maçã paradisíaca. Neste caso, Adão e
Eva, nús, continuariam brincando no paraíso até hoje? O que teria acontecido
se, sem provar do fruto proibido, jamais tivessem ficados cônscios de sua nudez
e com isto das suas possibilidades de procriação? Haveria Deus, então, ter
criado homens e mulheres em série? Homens e mulheres que por sua “livre e
espontânea vontade”, jamais teriam almejado o conhecimento, por obedecerem à
proibição divina? É inútil dizer que Adão e Eva foram induzidos a comer a
maçã que houve tentadores, o Diabo ou a serpente. Toda criatura provém de Deus,
assim aprendemos. Por conseguinte, o Diabo e a serpente também foram criados
por Deus. Teria, então, o Deus bondoso criado o Diabo e a serpente para fazer
parte do circo e com sua assistência, provocar os seres humanos
simplórios? E se assim fosse, porque Deus ficou tão ofendido com a
refeição vegetariana, a ponto deste pecado ficar inexterminável no mundo por
ele criado? Ele sabia o que iria acontecer. Sinto um Pastor me puxando
pelo braço: não foi bem assim não; Lucifer, o Diabo, era um renegado do reino
celeste de Deus. Não entendi Pastor... Um renegado ao reino celeste de Deus?
Como? Se o “reino do céu” equivale à felicidade, conforme está sendo prometido
aos fiéis, então por lá não pode haver oposição, nem rebeldes, nem renegados.
Ou é ou deixa de sê-lo. Se o reino de Deus garantisse o estado da
felicidade completa, dificilmente “Luc” teria a ideia de agir contra Deus. Se,
porém, no Reino do Céu não existiu a felicidade absoluta, então Deus não teria
sido onisciente bastante para criar tal clima. Vou dar razão aos que não
encontram motivação lógica para a contenda entre Deus e o Diabo. Antes de
Lucifer ter se aproximado do casal paradisíaco, para tentá-lo, Deus deve ter
sabido que a tentação vingaria. Na questão do “livre arbítrio” de Adão e Eva,
mesmo com a inclusão de “Luc” assume aspecto de Deus “ex machina”, pois tanto Lucifer
como Adão, Eva ou a serpente agiram dentro da vontade e da ordem recebida de
Deus, o onisciente. A história do criacionismo se faz sem pé nem cabeça, além
do mais eu não gosto de maçã nem pequei involuntariamente.
Se quiserem saber mais, minhas fontes são: Sam Harris,
Richard Dawkins, Erich Von Däniken, Stephen Hawking e outros cristãos.
Texto postado originalmente na confraria Logos & Mythos
sob o link: http://logosemithos.blogspot.com.br/2012/06/o-pecado-involuntario.html e
editado pelo autor para postagem no blog Mundo Da Anja(link)